sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Pavilhão do Chá




Acabo de realizar um de meus sonhos. Concluí as fotografias do álbum que fiz sobre a nossa cidade. Os olhos da infância se aliaram à experiência e à vivência que carrego de tantos mundos. Percorri a cidade buscando aquelas imagens que as minhas retinas fixaram desde menino. Muitas delas estão vivas, presentes. Outras desapareceram. A vida é assim, mutante. Essa dinâmica que alimenta a evolução está presente em cada ação humana, tantas novas faces surgiram igualmente belas.


Os meus olhos percorreram muitos lugares. Cada lugar tem o seu encanto. Foram momentos de grande satisfação, ver a cidade com a intenção de compartilhar com os paraibanos o que os meus olhos veem. O olhar de um fotógrafo carrega uma magia própria. Parece que atrai fatos inusitados.


A relação com a fotografia está associada a um modo zen budista de ser, onde se vive em permanente contemplação e absoluta concentração, vigilância plena. As suas ações passam a ser extensão de seu próprio ser e você se torna o que você faz. Você está ligado direto com a energia criativa. Dois modos indissolúveis: o ser e o fazer. Não há distinção. Você é agente e veículo, tudo numa coisa só.


A fotografia está em absoluta sintonia com esse universo. Quando você dispara a máquina não há retorno, a imagem já está ali. O tempo congela. É verdade que a tecnologia digital rompeu em parte com essa magia. As fotos são vistas no mesmo instante que você captura, desapareceu o rito, não há mais o que revelar. Isso faz com que essa sincronia com o tempo se desfaça, é como se não houvesse mais a cerimônia, a comunhão com esse mundo mágico que envolve o fotógrafo se fragiliza.


Não consigo fazer fotos com o braço estendido, com a câmera separada de meu corpo. Ela é como se fosse um órgão que eu incorporei no percurso da vida, ela está sempre ligada ao meu olho.


O que inspirou esse discurso esotérico foi a visita que fiz ao Pavilhão do Chá. O chá e aquela arquitetura exótica nos remetem à Ásia e a todo esse mundo contemplativo. Foi impressionante. A patologia que o edifício apresenta por falta de manutenção expõe a tela e as nervuras, que caracterizam a técnica da argamassa armada, provocando a oxidação das ferragens e o risco de fraturas potencialmente perigosas.


Foi uma descoberta fascinante. Constatei, por causa daqueles problemas, que estava diante de uma importante obra em argamassa armada. Não temos conhecimento de outros exemplos dessa tecnologia no Brasil, daquele período.


A argamassa armada, também conhecida por ferrocimento, foi uma invenção do francês Joseph Louis Lambot, que depositou a patente em 1848. Quem deu notoriedade a esse processo foi o engenheiro e arquiteto italiano Pier Luigi Nervi, quase um século depois, que chegou a fazer barcos com essa tecnologia, fez a marquise da Fiera Milano e outras arquiteturas emblemáticas, na mesma época em que se construiu o Pavilhão do Chá.


No Brasil, somente nos anos 80, essa tecnologia ganhou força no ambiente acadêmico através da Universidade Federal de São Carlos que vem estudando, desenvolvendo e aplicando a argamassa armada como alternativa construtiva. O arquiteto pernambucano Aldênio Barreto é um dos pioneiros do grupo da UFSC. Um de seus projetos é a sede pernambucana da Associação Brasileira de Cimento Portland, ABCP, na margem esquerda do rio Capibaribe.


A natureza desse processo permite a execução de uma arquitetura orgânica, visceral, ao modo de Antoni Gaudí. “A concepção técnica e artística de uma obra são idênticas”, dizia Nervi, em declaração consonante com o modo integrado zen budista de ser. A Paraíba estava na vanguarda e perdeu esse caminho. A geração atual tem o compromisso de resgatar essa trajetória.

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